Lula nunca desce do palanque. Ao discursar no Natal dos Catadores em São Paulo, não foi diferente. Além de chavões novos, como um governo com “um olhar humanista com o povo humilde”, poderia ter reeditado os velhos, como “incluir o pobre no orçamento”, “tirar milhões da miséria” ou até, por que não, o “churrasquinho com picanha”. Quem se oporia a essas promessas? Mais uma vez, porém, o presidente eleito antagonizou justiça social e responsabilidade fiscal. “A gente não cuida do pobre se ficar vendo estatística. Se ficar olhando para o orçamento, se ficar olhando para a política fiscal do governo, sempre haverá uma prioridade acima dos pobres.”
Ora, presidente, é precisamente o contrário. Para cuidar dos pobres, ou, melhor, tirá-los de vez da pobreza, é essencial olhar para o orçamento e a política fiscal. A razão é óbvia. Para fazer políticas sociais, sobretudo a mais eficaz e duradoura delas, a geração de empregos, é preciso ter dinheiro para distribuir e investir.
Lula deveria saber que a irresponsabilidade fiscal não é a solução, mas a raiz de todos os males. Afinal, foi ela que mergulhou o País na mais profunda recessão de sua história, dizimando empregos e recolocando o Brasil no Mapa da Fome. De fato, ele sabe. Tão bem que durante a campanha fez o diabo para esconder aquela que foi a responsável pelo descalabro das contas públicas, a sua criatura, Dilma Rousseff, a qual, por sua vez, fez o diabo para maquiar esse descalabro, nas chamadas “pedaladas fiscais”, que levaram ao seu impeachment. Mesmo eleito, Lula insiste em novas pedaladas eleitorais. O que eles sabem o povo brasileiro não esqueceu. Mas não custa lembrar.
Em seu primeiro mandato, Lula foi brindado com uma bonança perfeita: a herança bendita de FHC (o controle da inflação com o Plano Real, cimentado pelo tripé macroeconômico – meta para a inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal) – combinada a um superciclo das commodities. Nesse céu de brigadeiro, o governo ampliou programas assistenciais, impulsionou o consumo, ampliou gastos com os servidores e empregou bancos públicos para anabolizar empresas (os “campeões nacionais”), ao mesmo tempo que negligenciou as condições para um crescimento sustentável, como infraestrutura, produtividade e educação. Findo o ciclo, o PT dobrou a aposta: mais gastos, sem disciplina. O resto é história.
Segundo o FMI, no governo FHC e no governo Bolsonaro o crescimento da economia brasileira ficou cerca de 1 ponto porcentual ao ano abaixo da média dos países emergentes. Nos governos do PT ficou quase 2 pontos porcentuais abaixo, ou seja, um desempenho ainda mais medíocre do que a já medíocre média brasileira. Até agora, a única proposta econômica de Lula é um grande salto para trás: redobrar a aposta na “Nova Matriz Econômica”.
Sem equilíbrio entre receitas e despesas, o crédito público se esvai, a moeda se desvaloriza, a inflação sobe, os juros também, o consumo cai, a produção também e, finalmente, os empregos evaporam. Todo mundo empobrece, os pobres mais que os ricos, e falta dinheiro ao governo para ajudá-los. Por diversos que sejam os ingredientes das políticas econômicas populistas, a receita é sempre a mesma: vender uma satisfação instantânea e passageira sacrificando uma prosperidade estável e contínua. O que os demagogos dão com uma mão hoje, retiram em dobro com a outra amanhã.
Não há quem não se sensibilize com a miséria que se alastra a olhos vistos em um dos países mais desiguais do mundo. A população espera por programas sociais robustos e o contribuinte paga feliz por eles. Mas esses programas precisam ser sustentáveis. E essa sustentação depende de contas públicas equilibradas e de mais produtividade no mercado de trabalho. Mas, até agora, Lula e sua equipe não propuseram nenhuma política substancial nem em um sentido nem em outro. Gasto é “vida”, como dizia Dilma, mas só se for bem empregado, com recursos que existem, para gerar novos recursos. Senão, é miséria.
Responsabilidade social e responsabilidade fiscal não são, como sugere Lula, como água e óleo, mas só duas faces da mesma moeda.
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