quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Bolsonaro perde 93% de engajamento, após derrota e silêncio nas redes sociais


Aparição. Bolsonaro em vídeo publicado em 2 de novembro, quando pediu para apoiadores desbloquearem estradas

A redução brusca no ritmo das postagens e a falta de transmissões ao vivo reduziram o fôlego do presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais. Levantamento da consultoria Bites mostra que, na comparação com o mês anterior, o chefe do Executivo teve uma queda de 93% em suas interações (soma de curtidas, compartilhamentos e comentários) neste mês no Twitter, Instagram e Facebook. A média diária, que era de 7,6 milhões em outubro, passou a 487,7 mil.

Ontem, o presidente postou uma foto sua nas redes, sem legenda — a publicação anterior no Twitter e Facebook, por exemplo, havia sido no dia 16. O cenário era bem diferente antes da derrota nas urnas, quando as publicações eram frequentes. Em outubro, levando-se em consideração também YouTube e TikTok, a base de seguidores havia crescido 12,7% (6,8 milhões de perfis a mais no conjunto). A ausência também teve impacto no ritmo de aumento das contas que acompanham Bolsonaro — em novembro, a subida foi de 6%, o equivalente a 3,6 milhões de seguidores. O presidente também reduziu as aparições públicas — ontem à noite, esteve no jantar da bancada do PL.

— É um desânimo natural de parte dos seguidores com a falta de interações dele nas redes sociais mais clássicas. Tem um pouco de decepção e quebra de expectativa também. Os seguidores esperavam que ele falasse sobre os protestos — explica o diretor-adjunto da Bites, André Eler, referindo-se aos atos antidemocráticos que bolsonaristas vêm fazendo desde dia 30 contra o resultado das eleições, primeiro bloqueando estradas e, depois, na frente de unidades dos Exército, pedindo intervenção militar.

Como O GLOBO mostrou semana passada, nem mesmo os pedidos de contestação do resultado das urnas engajaram a base no Twitter. Atualmente, o presidente investe em publicações no Linkedin e Telegram, canais que concentram poucos eleitores, em um tom institucional, o que não engaja a militância.

Nos últimos dias, o momento que conseguiu atrair mais internautas foi quando Bolsonaro rompeu o silêncio após perder para Lula. Em 2 de novembro, o presidente publicou vídeo pedindo que seus apoiadores desobstruíssem vias públicas. Essa mesma gravação foi replicada no Instagram, Twitter e Facebook, redes que juntas somaram mais de 8,29 milhões de interações.

De modo geral, as redes do presidente não foram alimentadas nos últimos 30 dias. No Facebook, por exemplo, foram cinco publicações, além da gravação. A principal diferença de engajamento ficou com a transmissão do pronunciamento que ele fez para a imprensa no dia 1º, que ficou salva na rede social.

A plataforma em que mais publicou foi o TikTok. No total, foram 17 vídeos antigos que passaram a ser veiculados 12 dias após o pleito. O esforço resultou em 900 mil seguidores e ajudou a segurar as métricas.

No YouTube, onde o presidente fazia lives semanais com atualizações do seu governo, o engajamento despencou. Após a eleição, apenas o vídeo do dia 2 gerou mobilização — mais de 1 milhão de visualizações. Os demais posts com notícias do governo, em que o presidente não aparece, ficaram na casa dos 100 mil views.

A ascensão de Lula

Já Lula cresce em ritmo constante após ser eleito presidente. No mesmo período, o petista, seguindo o ritmo de publicações pré-eleição, aumentou sua base em 16,3% com um ganho acima de quatro milhões de seguidores.

No Instagram, por exemplo, fez 56 postagens. O primeiro tuíte após a vitória, em que veiculava a foto da sua mão em cima da bandeira do Brasil, é o post mais curtido do Twitter, com 1,7 milhão. Desde então, o petista usa seus canais oficiais para informar sobre as tomadas de decisão referentes ao governo de transição.

Quinquênio para juízes é moralmente indefensável



Decisões que tentam restaurar privilégio extinto há 16 anos precisam ser repelidas com energia

São moralmente indefensáveis as decisões do Conselho da Justiça Federal (CJF) e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sobre a remuneração de juízes. Ambas demonstram que, no afã de manter privilégios, Brasília não enxerga a realidade em que vive o Brasil. É preciso repeli-las com toda a energia. É ocioso — mas infelizmente necessário — repetir que juízes e procuradores são as categorias mais privilegiadas do serviço público brasileiro, cujo salário médio as coloca entre os 2% de maior renda no país. No Judiciário, proliferam privilégios já extintos noutras áreas, como férias de 60 dias, promoções automáticas, licenças-prêmio, aposentadorias compulsórias e outras benesses.

Em 24 estados, só o vale-refeição de juízes supera o salário mínimo. Mais de 8 mil magistrados já tiveram remuneração igual ou superior a R$ 100 mil — isso mesmo, R$ 100 mil — pelo menos uma vez desde 2017. Eles são um terço dos que recebem supersalários acima do teto constitucional.

Apesar de tudo isso, no dia 16 o CJF aprovou, a pedido da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), o retorno de um benefício salarial extinto há 16 anos para juízes federais que entraram na carreira até 2006. Conhecido como quinquênio, o Adicional por Tempo de Serviço (ATS) é um aumento automático de 5% no salário a cada cinco anos, sem conexão com mérito ou produtividade. A decisão também prevê o pagamento retroativo, com correção pela inflação. Pela decisão, os juízes ganharão boladas milionárias.

Existe uma palavra para descrever a resolução: ignomínia. Não apenas pelo atual momento de penúria, com uma bomba fiscal prestes a estourar e a necessidade de encontrar espaço no Orçamento para manter o pagamento de R$ 600 aos brasileiros em situação mais vulnerável. Em qualquer circunstância, seria um acinte.

A resolução do CJF contraria decisão do Supremo que proibiu gratificações e adicionais fora do teto constitucional para remunerar servidores públicos. A relatora Maria Thereza de Assis Moura, contrária ao aumento, ressaltou esse ponto, mas foi vencida no plenário por sete votos a quatro. A tese vencedora destacou os direitos adquiridos, mesmo argumento usado pelos senhores de escravos no século XIX contra a Abolição. Oxalá o STF tenha a lucidez de corrigir o absurdo.

Na onda da decisão do CJF, Pacheco ressuscitou a descabida Proposta de Emenda Constitucional 63, que mereceria ser batizada de PEC da Desigualdade Social. Ela prevê o quinquênio de 5% para todos os juízes (não apenas os que entraram na magistratura até 2006) e para procuradores. Em 2019, nove das dez maiores remunerações no Estado brasileiro estavam em cargos no Judiciário e no Ministério Público. Para a sociedade, as duas esferas do governo consomem anualmente 1,8% do PIB, 11 vezes o custo de instituições similares na Espanha, dez vezes o da Argentina e nove vezes o dos Estados Unidos. Não há paralelo no planeta para a prodigalidade com que o Brasil trata seu Judiciário, conhecido pela lentidão, burocracia e ineficiência.

O Brasil precisa de uma reforma administrativa que acabe com os privilégios absurdos da elite do funcionalismo, em particular juízes e procuradores. Não da recriação de uma das poucas excrescências de que nos livramos. Os senadores têm o dever de enterrar a ideia descabida de Pacheco e de promover a reforma que o país merece.

terça-feira, 29 de novembro de 2022

Apoio do PT à reeleição de Lira é a rendição de Lula ao orçamento secreto



Em campanha, Lula chamou Arthur Lira de "imperador do Japão", acusou-o de comprar votos dos deputados com o orçamento secreto e declarou que Bolsonaro não passava de bobo da Corte. Agora, o PT apoia a recondução do imperador ao comando da Câmara, blindando o orçamento secreto. Se o Supremo Tribunal Federal não declarar a inconstitucionalidade das emendas sigilosas, Lula se arrisca a vir suceder Bolsonaro também no papel de bobo.

O PT chega com atraso ao bonde de Lira. A essa altura, o chefão do centrão já negociou com o PL de Bolsonaro e o União Brasil um revezamento nos próximos dois anos no comando da comissão mais cobiçada da Câmara: a de Constituição e Justiça. O PT negocia a formação de um bloco governista para tentar disputar os melhores assentos nas comissões e na mesa diretora da Câmara.

Partidos que já se associaram a Lira enxergam no assédio do PT uma perspectiva de conquistar postos no futuro governo. Segundo o deputado petista José Guimarães, o apoio a Arthur Lira "já está explícito" e deve ser visto como parte do esforço do governo de transição para assegurar "governabilidade" à terceira gestão de Lula.

Sem fazer política, nenhum governo sai do lugar. Mas o vocábulo governabilidade virou sinônimo de alianças espúrias e tolerância com os maus costumes. Uma vez restabelecida a atmosfera de toma lá, dá cá, seria conveniente esclarecer o que a turma do patrimonialismo deseja tomar e o que Lula se dispõe a dar.

Assembleia de SP aprova aumento de 50% do salário de Tarcísio com efeito cascata


Tarcísio de Freitas, governador eleito de São Paulo, em entrevista à imprensa após reunião geral com todos os coordenadores da transição - Danilo Verpa/Folhapress

A Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) aprovou nesta terça-feira (29) aumento de 50% dos salários do governador eleito Tarcísio de Freitas (Republicanos), de seu vice Felício Ramuth (PSD) e do novo secretariado, com efeito cascata também para outros servidores.

Foram 56 votos a favor e apenas 6 contrários. Eram necessários ao menos 48 votos no plenário —de um total de 94 deputados estaduais.

O projeto segue agora para sanção do atual governador, Rodrigo Garcia (PSDB), que estimou um impacto anual de R$ 1,5 bilhão aos cofres públicos.

A pauta foi articulada pela base de Rodrigo com a do futuro titular do Palácio dos Bandeirantes e com parte da oposição, com o objetivo de beneficiar outras categorias de servidores que ganham o teto. A medida não impacta o funcionalismo que ganha o piso, de acordo com parlamentares.

Com a mudança, a remuneração do governador passa de R$ 23 mil para R$ 34,6 mil; a do vice-governador sai de R$ 21,9 mil para R$ 32,9 mil; e a dos secretários, de R$ 20,7 mil para R$ 31,1 mil.

O primeiro artigo do projeto determina a manutenção dos antigos salários do Executivo em 2022.

O lobby para o aumento veio principalmente de policiais, auditores fiscais e outras carreiras que atingem o topo do funcionalismo, como mostrou a Folha. Eles alegam que os salários estão sem reajuste desde 2019 devido ao congelamento do teto —o salário do governador representa o limite.

A medida deve beneficiar servidores como policiais, tenentes, coronéis, auditores e professores universitários.

Parte dos deputados de oposição foi favorável ao aumento devido a um compromisso do Delegado Olim (PP), relator do Orçamento de 2023, que prometeu levar a Tarcísio a discussão sobre o aumento de salários mais baixos.

"Vou levar ao novo governador a proposta de aumento aos que ganham menos também", afirmou. Segundo ele, funcionários públicos concursados de nível superior não tinham aumento há muito tempo.

A deputada estadual Márcia Lia, líder do PT na assembleia, foi favorável ao aumento a partir desse acordo, que se deu de modo informal. Além disso, ela defende que a alta do teto pode encurtar a fila de espera dos concursados, pois muitos profissionais já aptos a se aposentar permanecem nos cargos porque não tiveram aumento.

"Existe esse acordo para melhorar a categoria de base, sim. Agora, algumas categorias estavam com salários muito defasados em relação ao acumulado da inflação. Muitos que estão no fim da carreira, como de uma autarquia, não se aposentam porque o salário não sobe há anos", diz.

Em entrevista no dia 17 de novembro, Tarcísio indicou apoio à proposta, mas disse que era preciso ter responsabilidade com a medida porque sai do salário do governador a baliza para o teto do funcionalismo.

"No final das contas, isso impacta uma série de carreiras e impede que uma série de profissionais tenham aumento real; já estão com perda salarial porque esse teto está congelado desde 2019", disse na ocasião.

Proposto em 19 outubro por parlamentares do comando da Casa –Carlão Pignatari (PSDB), Luiz Fernando (PT) e Rogério Nogueira (PSDB)–, o projeto tramitava com urgência. Foi adiado algumas vezes por falta de quórum.

Com relatoria do Delegado Olim (PP), a proposta foi aprovada por cinco líderes partidários em reunião conjunta de comissões em 8 de novembro. Republicanos, PL, do PT, MDB, PP e PSDB foram favoráveis ao aumento. Ricardo Mellão, líder do Partido Novo, foi o único contrário à medida.

Em tentativas de aprovação anteriores, houve mais votos favoráveis de deputados de partidos ligados a Tarcísio (Republicanos, PL e PP) do que de partidos ligados a Rodrigo (PSDB e União Brasil). A bancada da bala votou sim em peso, mas não foi suficiente.

Tarcísio terá uma base confortável na Casa —63 das 94 cadeiras. Rodrigo, que declarou apoio incondicional no segundo turno a Tarcísio e a Jair Bolsonaro (PL), também tem maioria.

A proposta para aumentar o salário do governador cabe somente à Assembleia —não pode ser uma iniciativa do Executivo.

De acordo com deputados envolvidos nos trâmites, a ideia teve o aval de Rodrigo e também de Tarcísio —já que o funcionalismo da segurança pública é parte importante da base eleitoral do novo governador.

Militar do Planalto atua em atos antidemocráticos e diz que Lula não sobe a rampa


O militar Ronaldo Ribeiro Travassos ao lado do advogado Frederick Wasseff no ato antidemocrático em frente ao QG do Exército em Brasília
O militar Ronaldo Ribeiro Travassos ao lado do advogado Frederick Wasseff no ato antidemocrático em frente ao QG do Exército em Brasília - Arquivo Pessoal

Um militar da Marinha aparece em áudios e vídeos enviados em um grupo de mensagens incentivando os atos antidemocráticos em frente aos quartéis das Forças Armadas e afirmando que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não tomará posse em 1º de janeiro.

Nas mensagens, Ronaldo Ribeiro Travassos também defende o assassinato de brasileiros eleitores de Lula. O militar, atualmente, está lotado no GSI (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República), chefiado pelo general Augusto Heleno, um dos aliados mais fiéis de Jair Bolsonaro (PL).

Procurado, ele disse que não comentaria suas falas e argumentou não saber se era ele mesmo nos áudios. A Folha então encaminhou as conversas ao militar, que não mais respondeu.

O GSI, por meio de nota, disse que não é sua competência "autorizar servidores para que participem de qualquer tipo de manifestação" e que "as supostas declarações demandadas são de responsabilidade do autor em atividade pessoal fora do expediente".

O GSI tem como atribuição a segurança do presidente da República. Atualmente, portanto, de Bolsonaro e a partir de janeiro passará a trabalhar para Lula.

Em tese, durante a transição, o gabinete poderia auxiliar fazendo a proteção do presidente eleito em alguns locais, caso fosse chamado pelo novo governo, e eventualmente atuar na posse. Mas isso vem sendo rechaçado pela equipe da Polícia Federal que faz a segurança do petista.

Há um clima de desconfiança no ar. A PF responsável pela segurança de Lula excluiu o GSI da sede da transição do governo, no CCBB, em Brasília. Também tem evitado sua participação na posse e concentrando a coordenação do evento.

Travassos é primeiro-sargento da Marinha e trabalha na divisão administrativa do gabinete de Augusto Heleno. Ele está lotado no Palácio do Planalto desde o final de 2016, quando Michel Temer (MDB) era presidente.


Em um vídeo gravado no dia 24 de novembro, data de estreia do Brasil na Copa do Mundo, Travassos critica colegas do GSI e da Presidência que não estão na manifestação no QG do Exército, em Brasília, pedindo golpe.

"Aí pessoal, tá lotado. 24 de novembro de 2022, horário do jogo do Brasil, mas o povo não quer nem saber, o povo está aqui lutando pelo Brasil. Eu tenho certeza que o ladrão não sobe a rampa. Agora, você que tá bonitinho em casa, quando seu filho virar boiola ou uma sapatão esquerdista, não reclame", diz ele.

Sobre a hipótese de o presidente eleito Lula não tomar posse, o militar diz em um áudio ter feito a previsão a outro integrante do GSI, o general Joaquim Brandão, que é assessor especial de Heleno.

"O general Brandão me perguntou lá no gabinete: Marujo, o que você acha? Acho não, tenho certeza, o ladrão [em alusão a Lula] não vai subir a rampa. Por que você diz isso? Porque eu confio no povo que tá lá no QG, em todos quartéis Brasil afora, confio nos caminhoneiros e nos índios. Se as Forças Armadas não fizerem nada, nós vamos fazer."

Nas redes sociais, há registros do militar nos atos do feriado de 7 de Setembro, capturados eleitoralmente pelo chefe do Executivo.

Na manifestação no QG do Exército, fotos, áudios e vídeos compartilhados em um grupo mostram que Travassos chegou a dormir ao menos uma uma noite no local junto aos manifestantes.

Além das falas golpistas, o militar diz nas conversas às quais a Folha teve acesso que haverá uma "guerra civil" no país.

"Estevão, apagou por quê? É isso mesmo, tem um monte de colega omisso. Tem gente aqui nesse grupo, tem grupo de fora, meu prédio tem 17 moradores, dos 17, seis fazem o L. Nós precisamos saber quem é quem, porque a guerra civil vai rolar", afirma Travassos.

A mensagem enviada ao grupo era uma resposta a Estevão Luiz Soares, outro militar da Marinha lotado na Presidência.


Após a citação à suposta guerra civil, Travassos afirma que defenderia qualquer patriota, como os apoiadores de Bolsonaro se autointitulam, mas daria um tiro na cabeça do próprio irmão se ele fizesse o L —gesto característico dos eleitores de Lula.

"Não tô falando isso de brincadeirinha, não, é sério. Quem faz o L é terrorista. Tem que morrer mesmo, ou mudar ou morrer, porque não tem jeito uma pessoa dessa", diz ele.

Travassos é militar da ativa e, portanto, não poderia participar de manifestações político-partidárias.

A Constituição proíbe a filiação de militares da ativa a partidos políticos e a norma que rege a categoria diz que são proibidas "quaisquer manifestações coletivas, tanto sobre atos de superiores quanto as de caráter reivindicatório ou político".

A proibição é tratada pelo próprio Travassos em um dos áudios. Em resposta a um outro integrante do grupo, ele afirma que, embora 80 pessoas integrem o grupo, apenas cerca de 15 foram para a manifestação no QG do Exército em Brasília.


Na fala, porém, ele afirma que "o general" tem conhecimento da sua participação nos atos antidemocráticos, sem citar se o general seria Augusto Heleno, chefe do GSI.

"Pelo amor de Deus, alguém tá preocupado com isso? Ah, não vou não porque sou militar e não posso. O general sabe que eu tô aqui e eu falei que tem bastante gente, tem gente da segurança e tudo. Oh, meu irmão, é tudo ou nada, não tem conversinha."

Além de Gil, lunáticos não perdoaram nem Eduardo Bolsonaro. É hora de parar


Eduardo Bolsonaro (PL-SP) no estádio no Catar no jogo do Brasil contra a Suíça nesta segunda (28)

A revolta que a aparição do deputado Eduardo Bolsonaro no jogo do Brasil contra a Suíça na Copa do Mundo do Catar provocou em bolsonaristas nas redes sociais mostra bem o clima delirante em que se envolvem os que buscam um “terceiro turno” da eleição presidencial, acampando em torno de quartéis, reivindicando uma intervenção militar para evitar a posse do presidente eleito Lula em 1º de janeiro. Sentiram-se abandonados pelo filho Zero Três de Bolsonaro, entendendo que ele estar vibrando com o futebol do Brasil no Catar é sinal de que nada acontecerá no país nos próximos dias. Mas é preciso que esses lunáticos parem de agir como guerrilheiros, perseguindo seus supostos inimigos pelo mundo afora.

O que aconteceu no Catar com um dos maiores ícones da cultura brasileira, Gilberto Gil, é repugnante. Mais perigoso ainda é justificar a perseguição política como se ela nada significasse. O empresário de Volta Redonda Ranier Felipe dos Santos Lemache admitiu que fazia parte do grupo que assediou moralmente Gil e sua mulher, Flora, mas negou tê-lo xingado.

Ele não entende (ou finge não entender) que perseguir uma pessoa para criticá-la ou xingá-la em locais públicos ou privados é crime, pois todos têm o direito de pensar e agir como quiserem sem ser perseguidos ou moralmente atacados. É preciso desnaturalizar essas atitudes, pois a vida em sociedade pressupõe a convivência entre contrários. A liberdade de expressão não permite ataques e acusações levianas, que devem ser reparadas na Justiça.

O senador Renan Calheiros (MDB-AL), a propósito da agressão a Gil, disse que apresentará uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para tipificar a intolerância e crimes contra o Estado Democrático de Direito. Ele citou outros casos de assédio moral acontecidos recentemente, como ataques a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) no Egito e ao ex-presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia num resort turístico.

Deveria ter citado também os ataques feitos à atriz Regina Duarte, ex-secretária de Cultura de Bolsonaro, praticamente expulsa de um teatro em São Paulo aos gritos de “Fora, Bolsonaro”. Também o deputado federal Kim Kataguiri, do União Brasil, principal liderança do Movimento Brasil Livre (MBL), foi impedido de participar de uma palestra na Universidade Federal de São Paulo na última sexta-feira, agredido e expulso do recinto por militantes de esquerda.

Em tempos de Copa do Mundo, o futebol não poderia deixar de ser palco desses extremismos. O bolsonarista Neymar, principal jogador da seleção brasileira, sofreu uma contusão séria no tornozelo direito e teve de ser substituído. Sua desdita foi comemorada por petistas, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, disse um “já vai tarde”, aos berros. Houve também quem sugerisse que torcêssemos contra a seleção brasileira para não dar ao presidente Bolsonaro a chance de usar uma eventual vitória da seleção. Ou que ninguém usasse a camisa amarela, pois tornara-se um símbolo bolsonarista.

Bem fez o presidente eleito Lula ao incentivar o uso dela e dos símbolos nacionais como a bandeira, na comemoração futebolística, como sempre aconteceu. Além do mais, é ridículo tentar torcer a tendência natural de vibrar com a vitória da seleção devido a rivalidades políticas. Nem mesmo durante a ditadura militar, quando as razões políticas eram mais graves, foi possível boicotar a seleção que se tornou tricampeã do mundo em 1970 no México.

O futebol sempre foi usado por governantes, especialmente ditadores ou autocratas, como soft power político, por isso governos como os do Catar ou da Rússia, em 2018, quiseram sediar a Copa do Mundo. Resultados do futebol no Brasil servem para eleger jogadores, como o senador Romário, mas não ajudam o governo de turno. Mesmo na ditadura, os governantes se dobraram à tentação de tentar tirar proveito da seleção: Médici, que gostava realmente de futebol, interferiu para que Dario fosse convocado e Saldanha deixasse de ser o técnico do time vitorioso de 1970, e Geisel, que não gostava, tentou convencer Pelé a voltar à seleção em 1974.

Em 2002, com direito a cambalhota de Vampeta na rampa do Palácio do Planalto e beijo de Fernando Henrique Cardoso na taça, o candidato Jose Serra perdeu a eleição. Antes, em 1994, o Plano Real teve mais importância para a eleição de FH do que a vitória na Copa. De lá para cá, nem mesmo a derrota em casa em 2014, com a humilhação dos 7 a 1 e tudo, impediu que a então presidente Dilma fosse vitoriosa. Lula se reelegeu em 2006 e elegeu Dilma em 2010, apesar das derrotas brasileiras.

TSE só encontra R$ 13,5 milhões na conta do PL, multado por questionar urnas


O presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, em entrevista coletiva para esclarecer ação que questiona segurança das urnas (REUTERS/Ueslei Marcelino) - REUTERS

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) só encontrou R$ 13.599.298,26 na conta do PL (Partido Liberal), multado em R$ 22.991.544,60 por litigância de má-fé ao questionar a segurança das urnas eletrônicas.

O valor foi bloqueado na conta do Banco do Brasil do partido às 7h23 da última sexta-feira (25) preventivamente, ou seja, antes mesmo do julgamento de recursos.

A indisponibilidade dos valores foi solicitada pelo juiz Marco Antônio Martin Vargas em 24 de novembro às 13h17, um dia após o presidente da corte, Alexandre de Moraes, estipular a multa.

O restante será descontado da conta da legenda na medida que os duodécimos do fundo partidário forem sendo depositados. Casos os recursos do PL sejam concedidos, os valores são desbloqueados.

O ministro Alexandre de Moraes negou na quarta-feira (23) a ação do PL que visava invalidar votos depositados em parte das urnas no segundo turno das eleições, quando o candidato do partido, Jair Bolsonaro, foi derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Ele condenou a coligação de Bolsonaro, formada por PL, PP e Republicanos, ao pagamento de multa por litigância de má-fé. Determinou ainda o bloqueio dos fundos partidários das três legendas da coligação até o pagamento da penalidade imposta. Posteriormente, concentrou a punição no PL, porque PP e Republicanos alegaram não ter participado da ação.

Em nota, o PL informou que vai adotar todas as medidas adequadas para restaurar "a liberdade, o direito à livre atividade parlamentar e partidária, o direito à liberdade de expressão e, mais ainda, o direito de se poder contestar as decisões judiciais sem sofrer qualquer retaliação".

O recado do Supremo a Bolsonaro sobre os atos nas portas dos quartéis


Presidente Jair Bolsonaro posa para foto ao lado do produtor rural Julio Nunes, líder de protestos golpistas alvo do TSE e do STF, em registro do ano passado

Os ministros do Supremo Tribunal Federal enviaram diversos recados nos últimos dias a Jair Bolsonaro e seus aliados mais próximos, todos numa única direção: se quiser contar com a boa vontade da corte depois de deixar o governo, o presidente da República deve parar de insuflar questionamentos sobre o resultado das urnas e atuar para desmobilizar os manifestantes que estão aglomerados nas estradas e nas portas dos quartéis Brasil afora, pedindo intervenção militar.

O portador da mensagem, na maior parte das vezes, foi o ministro Gilmar Mendes, decano da corte, que se reuniu com o presidente da República na terça-feira da semana passada para uma longa conversa, e também falou com ministros e pessoas da confiança de Bolsonaro.

No encontro com o presidente, que ocorreu na véspera da apresentação do relatório do PL que subsidiou uma ação pedindo a anulação de parte dos votos do segundo turno, Gilmar não colocou as coisas nesses termos, pelo contrário.

Mas disse que cumpre a Bolsonaro exercer suas funções constitucionais – e que, ao invés de questionar o resultado das urnas, ele deveria estar dedicando seus últimos dias de mandato à organizar a oposição a Luiz Inácio Lula da Silva.

Gilmar ainda sondou o humor do presidente sobre a transição de governo e as manifestações. Na volta da conversa, relatou aos colegas de corte que Bolsonaro estava tranquilo, mas nem tinha interesse em discutir a questão do relatório e da ação do PL e tampouco demonstrou qualquer intenção de pedir que seus seguidores saíssem das ruas.

Em outra frente, o próprio Gilmar conversou com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, com o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, e com o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Jorge Oliveira, nomeado por Bolsonaro e amigo do presidente da República.

Militantes antidemocráticos acampados em frente ao Comando Militar do Sudeste, na cidade de São Paulo; sem reconhecer o resultado legal das eleições, eles defendem golpe militar

Nessas ocasiões, foi mais enfático. Argumentou que na prática o governo acabou e que o ideal seria que o presidente usasse os dias que restam para acabar com qualquer requisito de tumulto institucional antes de deixar o Planalto — e, claro, demonstrar que merece um crédito de confiança do Supremo.

Ninguém falou da possibilidade de Jair Bolsonaro ou de seus filhos serem presos após o final do governo. Nem precisava. O medo que o presidente da República tem de ser punido pelo Supremo no âmbito do inquérito das fake news ou no das milícias digitais, é conhecido.

Por isso mesmo, é assunto constante das conversas de seus aliados com interlocutores de fora do governo. Quando falam com integrantes do STF, eles sempre argumentam que Bolsonaro se sente injustiçado pela corte para defendê-lo.

Nesse contexto, preocupa os ministros a ideia sempre disseminada nos protestos de que o presidente da República está esperando as aglomerações populares “engrossarem” para agir.

A violência empregada em alguns locais — como no Mato Grosso, onde vários pontos da BR-163 foram bloqueados e ônibus queimados — também assusta.

Tanto os ministros do Supremo como o círculo mais próximo de Lula temem que as manifestações continuem ocorrendo mesmo depois da posse do petista. Nesse caso, o novo governo já teria que começar desmobilizando protestos, cenário que o presidente eleito quer evitar.

Tanto Ciro como Jorge Oliveira e Valdemar se propuseram a ajudar, mas não se sabe até que ponto vão conseguir demover Bolsonaro de seu ânimo beligerante.

Depois de três semanas recluso no Palácio da Alvorada, recebendo poucas visitas e falando menos ainda, Bolsonaro voltou a aparecer em público no final de semana, em uma formatura da Academia Militar das Agulhas Negras. Mas passou o evento todo calado.

Valdemar e seus aliados do PL tem tentado também convencer o presidente a aproveitar os últimos dias do mandato para defender seu governo e fazer propaganda de seus feitos. "Se ele não fizer, quem vai fazer por ele?", argumenta um correligionário. Não tiveram sucesso nem nisso.

Difícil acreditar que venham a conseguir fazer com que o último ato de Bolsonaro seja o de desmobilizar os atos golpistas.

segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Ódio bolsonarista é um vírus imune à prevenção



Imaginou-se que a truculência de Bolsonaro teria o efeito de uma vacina. Mas as erupções de ódio de bolsonaristas ao redor do mundo mostram que o Brasil está diante de um vírus novo, que desafia a imunologia democrática. Quando até Gilberto Gil se torna alvo de ataques é um sinal de que a escalada de horrores passou a desafiar todas as nossas defesas civilizatórias.

Nos últimos quatro anos, proliferou a suposição de que cada surto de Bolsonaro funcionaria como uma nova dose de antígeno, reforçando os anticorpos que protegeriam a sanidade nacional. Brasileiros chamados de "maricas" na pandemia, magistrado xingado de "canalha" num 7 de Setembro, jornalistas tratados aos pontapés durante todo o mandato.

A banalização da truculência produziu o entusiasmo de alguns, a indignação de muitos e a resignação de tantos outros. Os mais otimistas supunham que as urnas de 2022 levariam a um ponto de equilíbrio. Não se pode sobreviver numa democracia sem essa imunização adquirida pela perspectiva de alternância no poder, a única maneira de retomar algo que se pareça com a normalidade.

Mas a urna é vacina que previne contra vírus rotineiros. O ódio bolsonarista desafia todas as defesas democráticas. Contra ele, o único remédio talvez seja o amor de mãe. Os bolsonaristas radicais obviamente não ouviram suas mães.

O sujeito pode adorar o mito errado por uma noção míope de superioridade. Qualquer mãe entenderia isso. Mas perseguir o Gilberto Gil, ofender o Gilberto Gil, xingar o Gilberto Gil é demais. O Brasil terá que assumir o papel de mãe dos bolsonaristas. Só para dizer: "Respeite o Gil, meu filho. Ouça os discos do Gil. É para o seu próprio bem."

Recuperando premissas essenciais como o respeito aos desiguais, o Brasil talvez chegue a uma conclusão que salta aos olhos: A insistência com que bolsonaristas clamam nas ruas e na frente dos quartéis por uma intervenção qualquer das forças armadas revela que a crise real do país é semântica, não política.


Antes de discutir se Bolsonaro deu certo e mereceria um mandato eterno é preciso combinar o que é "dar certo". Aplausos e vaias não levarão a lugar nenhum sem a definição de quesitos, a escolha de índices, o acerto de critérios.

"Certo" se mede em número de mortos na pandemia ou na quantidade caixas de cloroquina compradas pelo Exército? Qual seria o peso relativo da distribuição indiscriminada de armas? Consciência social em ano eleitoral é um bom sinal ou uma tentativa de compra de votos? Orçamento secreto é ferramenta de governabilidade ou a institucionalização do mensalão?

As interrogações indicam que o tempo de sobrevida do golpismo depende da qualidade da terceira gestão de Lula. A única melhor maneira de demonstrar que o errado não deixou de ser errado seria fazer o certo. Deve-se partir do básico: devoção à ciência, controle de armas, políticas sociais duradouras, intransigência com corruptos.

A aversão dos bolsonaristas ao resultado da eleição dá ao brasileiro que confia nas urnas eletrônicas a impressão de que está perdendo alguma coisa. A metafísica é muito mais rica do que esse materialismo chato em que o pão é sempre pão, o queijo nunca passa de queijo, e o voto é sempre inapelavelmente a expressão da vontade do eleitor.

As teorias conspiratórias são mais criativas. Quem rejeita um roteiro que renega a realidade para pregar viradas de mesa e intervenções militares se priva de uma boa ficção. Mas reconhece que a realidade continua sendo o único lugar onde se pode obter o respeito à vontade da maioria e o convívio entre contrários. O nome da vacina ainda é democracia. O negacionismo eleitoral leva à barbárie.

sábado, 26 de novembro de 2022

À espera do Messias em frente ao quartel ou à PF em Curitiba


Bolsonaristas acampados em frente ao Comando Militar do Sudeste, na cidade de São Paulo

Nos anos 80, ocupavam a Cinelândia, no Centro do Rio. Resistiram algumas décadas — hoje não há mais vestígios do que um dia foi a aguerrida Brizolândia. Em 2018, começaram uma vigília em frente à Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. Por 580 manhãs, renovavam sua fé gritando: “Bom dia, presidente Lula!”. Desde o segundo turno das eleições de 2022, estão acampados diante de quartéis ou bloqueando estradas.

Muda a cor das roupas e bandeiras — sai o vermelho, entram o verde e o amarelo. Mudam as palavras de ordem: “Lula livre!”, “Intervenção militar!” e... (o que é mesmo que queriam os brizolistas, além de lutar contra as “perdas internacionais”?). Em comum, a inabalável fé num messias. E a negação — do resultado de eleições, da condenação ou do ocaso do seu líder, do seu capitão, do seu salvador. Nunca chegam a formar multidões — talvez daí o empenho em fazer tanto barulho.

São pessoas que se desconectaram de si mesmas e embarcaram num delírio coletivo. Não necessariamente por desinformação ou déficit cognitivo, mas para se congregar no seio de uma ficção compartilhada. Para ter a sensação de pertencimento, de estar do lado do Bem. E suprir sua grande carência — e de todo ser humano: a de amparo. Funciona para qualquer seita, religiosa ou ideológica.

Em linguagem de autoajuda: deixam de ser gota para se sentir oceano. Mal sabem que, nessa mudança, passam de sujeito a objeto, tornando-se cada vez mais manipuláveis: a permanência no grupo implica investimento psíquico incessante. Paga-se um boi para entrar e uma boiada e meia para tentar sair do rebanho.

São gente como a gente — só que, no momento, impermeável a argumentos. Como os amigos que me entopem a caixa postal com notícias falsas, falsos alarmes, teorias conspiratórias. Aponto o erro, encaminho o desmentido — em vão. Daí a pouco recomeça tudo, numa amnésia voluntária. Foi assim na época do impítimã (“É golpe!”); é agora no pós-eleições (“É fraude!”). Pessoas até outro dia bastante sensatas, mas que marcam território com bandeiras na janela (de casa ou do carro), cantam o Hino Nacional no portão de algum quartel (felizmente, não em torno de pneus) e clamam pelo fim do Estado de Direito (pelo menos não com o celular na cabeça pedindo socorro a extraterrestres). Não refletem, agem reativamente. Ao domínio cultural tirânico das esquerdas e à patrulha vingativa das minorias, respondem com o orgulho da tosquice, a celebração anticiência.

Lula elegeu Bolsonaro, Bolsonaro reelegeu Lula. Sem uma terceira via à vista, é possível que esse “Dia da Marmota” ainda dure muitos anos.

Os brizolistas conseguiam, no máximo, atravancar a passagem de pedestres na Cinelândia. Os lulistas, que penaram no frio de Curitiba, perturbaram apenas o sossego do pacato bairro de Santa Cândida. Os “patriotas” infernizam a vida de quem precisa viajar ou transportar sua carga e podem causar estragos à economia, ao convívio civilizado, à democracia.

Vai ser um desafio trazê-los de volta ao diálogo. É longo e penoso o luto de um messias.

Ao endossar o golpismo de Bolsonaro, Valdemar meteu-se num pesadelo



Ficou fácil identificar os políticos do PL, do PP e do Republicanos no Congresso Nacional. Os membros da tríade do centrão são aqueles que, nas rodinhas de conversa, dedicam-se a falar mal de Valdemar Costa Neto. O personagem tornou-se uma rara unanimidade negativa. Generalizou-se entre os correligionários e aliados avaliação de que o dono do PL entrou em processo de autocombustão ao se associar à estratégia de Bolsonaro de contestação do resultado da eleição presidencial.

Os questionamentos ao comportamento de Valdemar intensificaram-se depois que Alexandre de Moraes, presidente do TSE, condenou toda coligação bolsonarista ao pagamento de multa de R$ 22,9 milhões por litigância de ma-fé. Os parceiros do PP e do Republicanos apressaram-se em isolar Valdemar. Num recurso protocolado na Corte eleitoral, informaram que o dono do PL não dispunha de procuração para enfiar as siglas na ação que questionou a segurança de parte das urnas usadas, exclusivamente, no segundo turno da disputa presidencial.

Moraes deferiu o recurso nesta sexta-feira. Na sua decisão, o presidente do TSE anotou que PP e Republicanos esclareceram, de forma inequívoca, "que reconheceram publicamente por seus dirigentes a vitória da Coligação Brasil da Esperança [encabeçada por Lula], conforme declarações publicadas na imprensa". O ministro acrescentou que os parceiros de Valdemar deixaram claro que, "em momento algum, questionaram a integridade das urnas eletrônicas, diferentemente do que foi apresentado única e exclusivamente pelo Partido Liberal".

Ao determinar a exclusão de PP e Republicanos da ação, Moraes determinou o levantamento do bloqueio que havia imposto às contas do fundo partidário das duas legendas. Simultaneamente, manteve "a condenação por litigância em má-fé única e integralmente em relação ao Partido Liberal". Que dizer: a multa que deveria ser paga solidariamente por três legendas passou a sufocar apenas o partido ao qual Bolsonaro está filiado. Uma agremiação que Valdemar controla como cartório.

A marola de questionamentos a Valdemar tornou-se uma onda de críticas que engolfou também os correligionários do PL. Inflado pelos congressistas eleitos na aba de Bolsonaro, o partido se equipava para usufruir, a partir da legislatura que será inaugurada em 2 de fevereiro de 2023, de um fundo partidário engordado pelas urnas. Sob os efeitos do torniquete financeiro imposto por Moraes, o PL rachou. A banda bolsonarista ataca Moraes. O pedaço não alinhado com o presidente flerta com Lula e submete Valdemar, nos bastidores, a um intenso fogo amigo.

A fome com que os parlamentares da direita avançam sobre Valdemar revela que a autofagia deixou de ser uma doença da esquerda. Até a semana passada, o hierarca do PL era exaltado como um dos mais hábeis administradores dos negócios partidários. Agora, é tratado como um gestor temerário da caixa registradora que financia as atividades da legenda. Antigos parceiros de Valdemar comportam-se como herdeiros da fúria canibal dos índios caetés, que comeram o bispo Pero Fernandes Sardinha no ano de 1556, no litoral de Alagoas.

Às voltas com um inusitado processo de autofagia, o dono do PL é pressionado a recorrer contra a decisão de Moraes. Mas Valdemar, já bem mastigado, hesita. Afora a imposição da multa milionária e do bloqueio do caixa partidário, Valdemar foi incluído pelo presidente do TSE no polo passivo do inquérito sobre milícias digitais. Um processo que corre no Supremo Tribunal Federal sob a relatoria do próprio Moraes. Ex-presidiário do mensalão, o dono do PL passou a conviver com o medo de retornar à cadeia. Estima-se que o caso das milícias ganhará novo impulso depois que Bolsonaro deixar o Planalto.

Ao se associar ao golpismo de Bolsonaro, Valdemar meteu-se num pesadelo do qual tem dificuldades para acordar.

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Saúde não comprou doses suficientes de vacina contra covid-19 para 2023, diz equipe de transição


Chioro foi ministro da Saúde e é um dos coordenadores do Grupo Técnico da área na transição. Foto: Divulgação/Ministério da Saúde

A equipe de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) identificou que o Ministério da Saúde ainda não formalizou a compra de todas as doses que seriam necessárias para a campanha de vacinação contra a covid-19 do ano que vem. “O que temos de informação é que o contrato de entrega de vacinas está vigente, mas o ministério não fez solicitação de quantidades suficientes para o ano que vem“, afirmou o sanitarista Arthur Chioro, coordenador do grupo de transição da Saúde e ex-ministro da pasta. Mais informações sobre o assunto deverão ser dadas em uma entrevista coletiva na manhã desta sexta-feira, 25.

A equipe identificou ainda não haver recursos reservados para despesas regulares do Ministério da Saúde no valor de R$ 10,4 bilhões, o que inclui compra de medicamentos, saúde indígena e pagamento de bolsas de residência médica.

“Não há no Orçamento R$ 10,47 bilhões para dar lastro para ações regulares do ministério, o que é preocupante. É preciso restituir (o valor) para garantir o funcionamento da máquina”, disse Chioro.

Questionado sobre a compra de doses para a campanha do ano que vem, o Ministério da Saúde afirmou apenas que já garantiu 700 milhões de doses da vacina covid-19 desde o início da campanha, das quais 550 milhões já foram distribuídas a todos os Estados e Distrito Federal.

Sobre a campanha de 2023, a pasta disse que “a estratégia de vacinação está em discussão pelo Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde, assim como o quantitativo necessário de doses para garantir a continuidade da imunização da população e a máxima proteção contra a covid-19″. A respeito do buraco de R$ 10,4 bilhões, a pasta destacou que “nenhuma política pública será interrompida” e que “está atenta às necessidades orçamentárias e buscará, em diálogo com o Congresso Nacional, as adequações necessárias na proposta orçamentária para 2023.

Farmácia Popular

De acordo com o médico, somente a assistência farmacêutica está com R$ 1,5 bilhão a menos do que precisaria para manter as ações planejadas, o que significa, segundo ele, redução de recursos para o programa Farmácia Popular e a compra de medicamentos contra o HIV e hepatites, por exemplo.

O Programa Nacional de Imunizações (PNI) também perdeu recursos, medida que o grupo de transição tenta reverter para ter condições de colocar em prática a promessa de ampliar as campanhas de vacinação já no início do mandato. “Temos de recompor para dar regularidade ao programa mas também pela necessidade de ampliar a cobertura vacinal no País. Já levamos os valores necessários para o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin”, afirmou.

Segundo Chioro, o rombo de R$ 10,4 bilhões faz parte do corte orçamentário de quase R$ 23 bilhões feito pela gestão Jair Bolsonaro (PL) no orçamento da Saúde para 2023. Além de recompor os R$ 10,4 bilhões necessários para custear ações básicas do ministério, o governo de transição quer recuperar integralmente esse valor para honrar as promessas da campanha, como mostrou o Estadão.

Bolsonaro transformou comunicação pública em máquina de propaganda



Novo governo precisa desmilitarizar Secom e livrar TV Brasil de programação chapa-branca

Responda se for capaz: quem é o secretário de Comunicação do governo Bolsonaro? O cargo, que já teve status de ministério, hoje é ocupado por um certo André de Sousa Costa. O ilustre desconhecido nunca pisou numa redação. É coronel da Polícia Militar de Brasília.

O enredo se repete na Secretaria de Imprensa do Planalto. O órgão chegou a ser chefiado por Carlos Castello Branco, o patrono do colunismo político brasileiro. Hoje está entregue a uma major da PM.

Os policiais não foram nomeados à toa. Estão lá para vigiar servidores, esconder informações e dificultar o trabalho dos repórteres.

Além de detestar o jornalismo independente, Bolsonaro despreza o princípio da transparência. Não se julga obrigado nem a divulgar sua rotina na agenda oficial.

Levar a comunicação pública a sério não é nenhum favor à imprensa. É sinal de respeito aos cidadãos, que têm o direito de saber o que as autoridades fazem e como elas gastam o dinheiro dos impostos.

O conceito de comunicação pública também tem passado longe da gestão da EBC. A estatal foi criada para administrar emissoras de rádio e TV ligadas ao governo. Nos últimos quatro anos, transformou-se em cabide de emprego para militares e outros amigos do poder.

Durante a campanha, a TV Brasil virou palanque eletrônico para o candidato à reeleição. Transmitiu comício, motociata e culto evangélico com discurso do presidente.

Na terça-feira, a Secom informou que não participará de reuniões com o gabinete de transição. O pretexto foi a irritação com tuítes do deputado André Janones. Na prática, a decisão vai retardar o diagnóstico do buraco no setor.

Apesar do boicote, a transição já começou a discutir medidas para desbolsonarizar a comunicação. Uma das ideias é restabelecer a divisão entre a TV Brasil e a antiga NBR, que transmitia a agenda do presidente. A fusão dos dois canais fez sumir a diferença entre o público e o estatal.

Um governo de esquerda não está imune à tentação de confundir comunicação pública com propaganda. Os primeiros mandatos de Lula misturam bons e maus exemplos na área. A saída de Bolsonaro vai desanuviar o ambiente, mas a sociedade precisa ficar atenta ao que vem por aí.