Reunião do grupo técnico de Saúde da transição com o ministro Marcelo Queiroga — Foto: Reprodução/Redes sociais |
Presidente transformou a pasta mais importante de um governo num parque de diversões negacionista
O relatório do Tribunal de Contas da União entregue ao governo de transição com o estrago provocado pelos quatro anos de Jair Bolsonaro na Saúde é uma mostra do que deverá ser radiografado em quase todas as áreas da administração: ideologia demais, gestão de menos.
Bolsonaro transformou a pasta mais importante de um governo num parque de diversões negacionista. Trocou um ministro que entendia do assunto, Luiz Mandetta, no início de uma pandemia, porque ele lhe fazia sombra ao dar entrevistas diárias e porque não endossava seu boicote ao distanciamento social e às demais medidas protetivas.
Loteou a pasta entre militares e olavistas, com os resultados conhecidos. Tanto vilipendiou as vacinas, sem nenhum ganho político evidente, só por seguir uma cartilha da extrema direita internacional de destruição da ciência, que o Plano Nacional de Imunizações, um orgulho nacional, está em petição de miséria.
Não foi à toa o chilique do presidente quando questionado no primeiro debate do pool de veículos de imprensa, no primeiro turno, a respeito da baixíssima cobertura vacinal para todas as doenças, inclusive algumas já erradicadas, e da relação que isso guarda com os ataques sem fundamento às vacinas contra a Covid-19. Bolsonaro sabia a bagunça que deixava enquanto só se preocupava com a reeleição a qualquer preço (e bota preço nisso; alô, defensores do teto de gastos feito letra morta em nome de votos!).
O governo Lula terá de trabalhar sobre escombros para reerguer o PNI, reorganizar o SUS e restabelecer a cooperação com estados e municípios, transformados em inimigos pela gestão atual. Terá de fazê-lo sem que a pandemia tenha terminado e diante da evidência de que novas ondas e novas variantes do coronavírus estarão à espreita por um bom tempo, o que demandará uma política permanente e um protocolo seguro para vacinação periódica e campanhas de conscientização.
Tudo diferente do que o governo continua fazendo, não tendo aprendido absolutamente nada com 700 mil brasileiros mortos. A simples fotografia da reunião da transição, com o time atual sem máscara e o que chega mascarado, é um símbolo gráfico e imediato da mudança de mentalidade que haverá na pasta a partir de janeiro.
Mas a que preço? Se em todos os ministérios excesso de fanatismo ideológico custa, na Saúde esse preço se conta em cadáveres. Graças a Augusto Aras e seu gabinete, os crimes cometidos na gestão da emergência sanitária seguem sem investigação. Em qualquer país, em qualquer momento da História, uma administração que se recusasse a comprar vacinas no primeiro momento diante de um vírus descontrolado e letal, que demorasse a socorrer cidades com oxigênio e que investisse contra medidas baratas, simples e eficazes como o uso de máscara só para fazer guerrilha política seria julgada de imediato.
O trabalho feito na Saúde — o time atual e o novo frente a frente, com os órgãos de controle fornecendo material técnico para a prospecção de dados — deveria ser exemplo para todos os grupos da transição.
Não há tempo a perder com correção de representatividade agora, quando a missão é apenas subsidiar quem assumirá com o maior número de informações possível, inclusive sobre os dispositivos-bombas a ser revogados de imediato após a posse.
A discussão acurada que garanta a mulheres, pessoas negras e indígenas, LGTBTQIA+ e aos grupos políticos não petistas que apoiaram Lula assento numa gestão que precisará ser ampla e eficaz, sob pena de ser constantemente emparedada pela extrema direita não democrática, tem de ser feita em paralelo, por Lula e Geraldo Alckmin.
Dos grupos técnicos se espera acuidade na mineração. Pois há muitas minas terrestres no caminho e muito pouca transparência onde quer que se cave.
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