sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Lula demora muito a trocar palanque pelo pódio



Menos de uma semana depois de insinuar, em Brasília, que poderia desdenhar da responsabilidade fiscal para garantir investimentos sociais, Lula voltou a jogar o falso dilema no ventilador. A diferença é que, dessa vez, soltou a língua no Egito. E fez questão de esclarecer que comete desvarios intencionais, não deslizes ocasionais. "Vai cair a Bolsa, vai aumentar o dólar? Paciência", disse Lula, apertando o botão de dane-se.

É grande a tentação de permanecer no palanque pelos próximos quatro anos. As falas de Lula alegram e confortam. Embora falsa, a sensação de que a dívida social do Estado com os brasileiros mais pobres será resgatada com saliva deixa mais leve a alma de devotos, militantes e puxa-sacos. O que não se compreende é que Lula suba no caixote até no estrangeiro.

"Ao distribuir as finanças de um país, vai tanto para a diplomacia, tanto as Forças Armadas, tanto para a guerra, e nada para os pobres, nada para os negros, nada para os indígenas", disse Lula, como se almejasse o trono de presidente do mundo.

"Eu participava das reuniões do G20 e sentia que não se falava dos problemas das pessoas. Quando se reúnem os países ricos, os pobres não existem, os negros não existem, os indígenas não existem", ele acrescentou. E nada sobre a estratégia que pretende adotar para realizar, a partir de 1º de janeiro, o serviço para o qual foi eleito.

Deixando-se de lado a confusão entre a emergência social brasileira e as mazelas do resto do planeta, fica a sensação de que Lula ficou sem assunto depois de discursar na conferência climática da ONU. Cancelou uma entrevista coletiva. Natural. Entrevistas incluem perguntas.

Em palanque de candidato, conversa fiada se confunde com programa de governo. Em pódio de presidente eleito, o lero-lero é apenas um mau começo.

Lula não ignora que precisa combinar seu pedido de licença legislativa para gastar emergencialmente R$ 200 bilhões com a definição de um novo marco fiscal que substitua o desmoralizado teto que limita as despesas do governo. Nos seus dois primeiros mandatos, escorou no superávit de caixa os investimentos no Bolsa Família.

A ruína de Bolsonaro impõe ao sucessor trabalho redobrado. Sob pena de entregar inflação, juros e estagnação econômica— um coquetel que envenena qualquer projeto social.

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