sábado, 7 de janeiro de 2023

Ambiguidade marca a fala de Lula aos ministros



Lula soou paradoxal na abertura da primeira reunião ministerial do seu terceiro mandato. Declarou que será "convidado a deixar o governo" quem fizer algo errado. Em seguida, afirmou que não vai "deixar ninguém na estrada". Quem promete uma coisa —aversão ao pecado— e o seu contrário -proteção aos pecadores— faz opção preferencial pela ambiguidade, não pela moralidade.

Aberto à imprensa, o discurso foi uma ode à composição política. Lula realçou que diploma de Harvard não rende votos no Congresso. Por isso, misturou no primeiro escalão currículos notáveis a biografias politicamente rentáveis, escolhidas graças a "acordos políticos."

A pregação inaugural de Lula foi feita na cabeceira de uma mesa em torno da qual estava Marina Silva, a ministra sem pesticida do Meio Ambiente, e Waldez Góes, o ministro que levou para dentro da pasta da Integração Nacional uma condenação do STJ a seis anos e nove meses de prisão por peculato.

De um lado da mesa havia Flávio Dino, o ministro da Justiça que critica a "milicianização da política" e promete elucidar do assassinato de Marielle Franco. Noutra ponta, estava Daniela do Waguinho, uma deputada federal tóxica que deu à pasta do Turismo um aroma miliciano.

Como se sabe, Lula não é debutante no Poder. Presidente de três mandatos, imaginou-se que buscaria a governabilidade sem concessões a alianças espúrias e com pouca tolerância aos maus hábitos. O cartão de visitas do ministério convida os otimistas a levarem o pé atrás.

Se por um lado Lula ressurge como restaurador dos valores democráticos, desarmando a arapuca golpista de Bolsonaro, por outro deixa-se arrastar pelo mesmo laxismo fisiológico de sempre. Alega que não pode criminalizar a política. Finge ignorar que a política é criminalizada por políticos que cometem crimes ou se aliam a criminosos.

Lula disse que seus ministros "têm a obrigação de manter a mais harmônica relação com o Congresso." Verdade. A harmonia entre os Poderes é um princípio constitucional. Mas não se confunde —ou não deveria se confundir— com avacalhação.

Foram harmoniosas as relações de Lula com os parlamentares nos seus dois primeiros mandatos. A concórdia, porém, foi obtida à custa de mensalões e petrolões. Dilma torceu o nariz. Foi deposta. Bolsonaro colocou a fatura dentro do orçamento secreto.

Imaginou-se que Lula 3 buscaria um meio-termo que lhe permitisse manter a cabeça nas boas intenções de uma Presidência que ele diz ser "definitiva" sem colocar os pés na lama. Se a primeira reunião ministerial serviu para alguma coisa foi para demonstrar que quem se alimenta de esperanças no Brasil pode morrer de inanição.

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