sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

O Brasil precisa de um exorcismo


 Fachada do STF após ataques terroristas

Como pessoas comuns se tornam monstros, mesmo que movidas por suas melhores intenções?

Não bastam as reformas política, tributária, administrativa, ambiental, nem mesmo a reforma psiquiátrica, o Brasil se tornou um caso de exorcismo. Não de um exorcista circense de igreja de subúrbio, mas de uma legião deles, de veteranos barra-pesada como o do filme, e tantos da vida real, que realmente sabem enfrentar demônios.

Quando o exorcista pergunta quem é o demônio que está no corpo do possuído, uma voz cavernosa rosna exalando um hálito fétido: “Meu nome é legião.” E é mesmo uma milícia de demônios que ocupa aquele corpo, e, como se sabe, a maior esperteza do demônio é nos convencer de que não existe. Talvez não com esse nome, ou espírito maligno, obsessor, encosto, do que quiserem chamar, mas é impossível negar a presença do mal no mundo.

Essa é a grande questão dos que têm fé na bondade, justiça e compaixão divina e na perfeição da Criação: como então explicar as manifestações explícitas do mal físico, mental e espiritual, pessoal e coletivo, em nosso mundo e em nosso cotidiano desde a alvorada da Humanidade?

A força do mal domina, de Caim a Calígula e Hitler a tiranos e soldados sanguinários, inquisidores, torturadores sádicos, até o médico estuprador e o assassino de Marielle Franco. O mal está entre nós, em nós, e sem aceitar isso o bem não faz sentido.

Todo mundo tem o bem e o mal em si, uns mais outros menos, de um e de outro: é da condição humana. E ao longo da vida um vai prevalecendo sobre o outro, ou o outro sobre o um. Como o ser humano é “o homem e suas circunstâncias” (filósofo Ortega y Gasset), o bem e o mal estão em permanente batalha em cada um de nós, e agora pior do que nunca, nas multidões sem rosto. Foi o que a filósofa Hannah Arendt analisou em “A banalidade do mal” a partir do nazismo e do genocídio.

Como pessoas comuns se tornam monstros, movidas por suas melhores intenções, tomadas por uma fé cega que as controla e impulsiona? Comportamentos mentais que nem Freud, Jung e Lacan, juntos, podem explicar ou justificar, fora das patologias.

No Brasil, são poucos os ateus raiz, geral acredita em um Deus, ou vários, ou em forças superiores, ou entidades, em qualquer coisa maior e mais poderosa do que nós, portanto incompreensível pela razão, só pela fé naqueles a quem podemos apelar em caso de necessidade, de quem esperamos proteção e satisfação de nossos desejos, e quem, como nosso criador, é o responsável por nossas ações e destino.

Estamos vivendo um verdadeiro “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, com fanáticos, cangaceiros e fazendeiros de celular, que dão atualidade à frase clássica do pensador inglês Samuel Johnson (1709-1784), “o patriotismo é o último refúgio dos canalhas”, complementada pelo filósofo de Ipanema Millôr Fernandes: “No Brasil, é o primeiro.”

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